No último ano, a situação já
era preocupante. O Ministério teve quatro titulares, com o Plano Nacional da
Educação (PNE) recém-aprovado e as discussões sobre a Base Nacional Comum
Curricular (BNCC) a pleno vapor. Agora, a perspectiva é de mais mudanças. Não
muda apenas o comando, também será alterado o escopo da pasta, que volta a ser
unificada com o Ministério da Cultura.
Dois documentos já divulgados pelo PMDB dão sinais de qual será a visão do novo governo para a Educação do país. Apresentado em novembro de 2015, Uma Ponte para o Futuro ressalta os encaminhamentos para a economia. A influência para a Educação é a defesa do "orçamento com base zero". Isso significa que o planejamento de gastos públicos se iniciariam sem o comprometimento com uma área ou projeto específico. Desse modo, os investimentos seriam sempre reavaliados de acordo com o que o governo vigente considerar prioritário. "A tendência é gastar somente o que é obrigatório com a Educação. Com a desvinculação, o investimento nessa área pode cair drasticamente", afirma Carlos Roberto Jamil Cury, professor aposentado da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Segundo a Constituição de 1988, 25% da receita de impostos e transferências dos municípios e estados e 18% da União devem ser investidos em Educação. Com essa determinação cumprida, chegamos a 5% do PIB investido na área. Neste ponto, o Plano Nacional de Educação é um avanço, pois prevê um investimento de 10% do PIB até 2024. Porém, é bom deixar claro que as leis falam de recursos de fontes diferentes.
Alguns dias antes de o Senado votar o impeachment, o PMDB divulgou trechos de um novo documento, mais voltado às questões sociais. O documento A Travessia Social tem duas páginas dedicadas à área educacional e destaca sete itens prioritários. Dividimos em grupos temáticos, que são comentados abaixo.
Avaliações externas
Nos três primeiros itens: "Prioridade para o Ensino Fundamental e Médio", "Foco na qualidade do aprendizado em sala de aula" e "Maior presença do Governo Federal no ensino básico" há um olhar direto para a Educação Básica. A eles, se soma "Dar consequência aos processos e resultados de avaliações". Olhando esse último aspecto e sabendo que os estados e municípios são os responsáveis diretos por essas etapas de ensino, há uma indicação de que as avaliações externas sejam utilizadas como parâmetro para a tomada de decisões pelo governo federal. O documento, contudo, é genérico e não permite saber exatamente o que cada item significa. Não dá para saber se a maior presença do governo federal se traduz em dinheiro, apoio técnico ou em novas avaliações.
Alguns especialistas,
contudo, acham que essa presença federal no ensino básico é complicada,
especialmente se as avaliaçõs forem tomadas como único critério de análise de
resultado. "O Estado consegue dar recursos, mas não tem uma
influência direta em sala de aula", aponta o professor Teodoro Zanardi, do
Departamento de Educação da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
(PUC-MG). "O Brasil tem uma realidade muito desigual em termos de
infraestrutura. Desse modo, é perigoso dizer que o ensino é ou não de qualidade
somente com base nas notas de provas externas", completa. As notas são um
indicativo da situação presente, mas não contam a história toda.
Bonificação para professores
Os dois itens seguintes
falam sobre o docente. O primeiro, "Foco na qualificação e nos incentivos
aos professores da Educação Básica", é mais generalista. Mas, o segundo
prevê um "Programa de certificação federal dos professores de 1º e 2º grau
em todo país e o pagamento de um adicional à remuneração regular, custeado pela
União". "A bonificação é muito válida desde que se tenha um padrão
minimamente homogêneo. O que a legislação atual diz é que nas escolas onde
houver um diagnóstico preciso das deficiências é tarefa prioritária do poder
público que essas deficiências sejam sanadas", explica Jamil. Por essa
razão, se a meta não for bem desenhada, o bônus faria um investimento inverso.
Segundo o professor, o que poderia acontecer é bonificar quem já está melhor,
reforçando a desigualdade, além de correr o risco de acirrar competições
desnecessárias, quando o espírito colaborativo traria mais benefícios.
Reforma do Ensino Médio
No último item,
"Diversificação do Ensino Médio segundo o interesse dos alunos", o
documento toca em um ponto problemático da Educação brasileira. Há tempos se
discute o que fazer com essa etapa de ensino, que ainda sofre muito com a
evasão. O texto defende a reforma por entender que hoje "não habilita o
aluno a coisa alguma, a não ser os exames de ingresso na universidade, embora
se saiba que a maioria dos alunos encerra aí sua formação escolar". Existe
um consenso diante dessa afirmação. Mas, também há um receio sobre como será
feita essa diversificação. "Caso priorizemos um Ensino Técnico é provável
que as camadas mais carentes sigam por esse caminho, enquanto os mais abastados
continuarão seguindo para a universidade", alerta Jamil, que defende um
investimento amplo no Ensino Médio integrado, em que se contemplaria a formação
geral, assim como a específica.
As ausências
Além das ações indicadas,
há algumas ausências no documento. A primeira delas é a Base Nacional Comum
Curricular, que já prevê mudanças no Ensino Médio. A segunda é o Plano Nacional
da Educação (PNE), que contém 20 metas a serem alcançadas até 2024, entre elas
a própria Base e o investimento de 10% do PIB em Educação. "A impressão
que fica é de um documento que ignora uma trajetória que está sendo concluída
em prol de algumas iniciativas pontuais", afirma Teodoro. Além disso, em
momento algum fala-se de Ensino Superior. "É importante frisar que essa é
a única etapa de ensino de competência direta da União", ressalta Jamil.
Os dois documentos não representam ainda o plano de governo de Temer e não podem ser avaliados como tal. Estima-se que nos próximos dias se possa ter uma ideia mais clara dos planos do presidente interino e de seu ministro, Mendonça Filho, para a área. Leia mais sobre o novo titular da pasta aqui.
(Crédito: Marcelo Almeida/Agência Brasil).