O
que significa saber muito bem o que se ensina? No Brasil, cultuamos o
diploma – quanto mais títulos, melhor a pessoa é avaliada e
melhor será sua remuneração. As evidências mostram que essa é
uma política equivocada: títulos nada têm a ver com a qualidade,
desempenho ou impacto do professor. Nem mesmo o nível de
conhecimento mais elevado tem impactos positivos sobre o aluno. Na
verdade, é mais comum o contrário. Se o professor é mais motivado
para a pesquisa científica e conhece os assuntos num nível de
elaboração muito elevado, ele tende a usar uma linguagem que não
se presta ao ensino de crianças e jovens.
Saber
o que ensinar significa dominar a fundo os conteúdos e o que está
por trás deles. É muito mais importante um professor de séries
iniciais saber o que está por trás do conceito de propriedade
aditiva da multiplicação ou onde reside a dificuldade dos alunos
para entender o princípio de multiplicar frações, por exemplo, do
que esse professor saber calcular derivadas ou rodar matrizes
mentalmente. É muito mais importante que ele saiba como ajudar as
crianças a usar e interpretar o sentido de pronomes numa frase (“A
mãe dela disse que ela era pobre”: quem era pobre, ela ou a mãe
dela?) do que conhecer a fundo a gramática histórica ou as teorias
linguísticas mais avançadas. Deu para entender?
No
caso da educação infantil esses conhecimentos são bem mapeados: o
professor precisa conhecer tão a fundo quanto possível a psicologia
do desenvolvimento, saber utilizar estratégias adequadas para
promover o desenvolvimento e saber interagir de forma adequada com as
crianças. Além disso precisa ter um bom domínio da língua, um
vasto conhecimento da literatura infantil e saber onde localizar
recursos. O professor precisa dominar alguns poucos conceitos, mas de
forma precisa. Precisa saber os fundamentos, mas não reverenciar
teorias ou cultuar os seus proponentes. E, sobretudo, precisa de
muita prática.
No
caso das séries iniciais do ensino fundamental o professor precisa
conhecer a fundo os conteúdos que ensina, as dificuldades mais
comuns dos alunos e as razões pelas quais eles têm essas
dificuldades. Esses conhecimentos são bem mapeados em algumas áreas,
como a da alfabetização de crianças ou do ensino de matemática
para as séries iniciais.
No
caso das séries finais, um indicador prático é que o professor
tenha um conhecimento amplo e preciso das disciplinas que leciona, e
um conhecimento um pouco mais avançado dos conteúdos do ensino
médio para saber o que o aluno fará com esses conhecimentos. Nessas
séries o professor precisa saber contar boas histórias, apresentar
sua disciplina em forma de narrativas que envolvam e capturem a
atenção de seus alunos.
O
governo federal e as faculdades que formam professores no Brasil
ainda não se dispuseram a preparar esse tipo de professor para as
redes de ensino. Em vez de propor currículos rigorosos para os
cursos, o Ministério da Educação patrocina exames que valorizam
mais conhecimentos genéricos e adesão a determinadas ideologias. As
faculdades, por sua vez, raramente possuem docentes que conhecem a
linha de frente, e limitam-se, nos melhores casos, a compartilhar
conhecimentos teóricos nem sempre atualizados.
O
que podem os municípios fazer? Aqui há solução, e a solução é
simples: elaborar testes de seleção em que os professores
demonstrem os conhecimentos sobre o que vão ensinar. Também devem
informar às faculdades que formam esses candidatos sobre o que vai
cair no exame e sobre os resultados obtidos. Em pouco tempo as
universidades se adaptarão às necessidades dos prefeitos. E em
alguns anos começarão a chegar jovens preparados para o exercício
do magistério.
João
Batista Araújo e Oliveira é presidente do Instituto Alfa Beto
(VEJA)