Quando
comecei a dar aulas em uma determinada escola, em Camocim (CE), conversei com um
colega mais experiente. Queria que ele me ajudasse, afinal eu estava no começo
e ele já estava na estrada há muito tempo. Ele me aconselhou: “Sua função na
sala de aula é passar o conteúdo, não importa o que ocorra. Portanto, procure
abstrair o ambiente, fixe seu olhar num ponto da parede, concentre-se e exponha
a matéria”.
É óbvio que
não segui este ‘conselho’, nem me parecia possível agir dessa forma. O que o
meu colega não percebia, ou simplesmente não fazia questão de levar em conta, é
que a aula não é uma relação física com a parede ou com um ‘ponto imaginário’,
mas sim com indivíduos de carne e osso, seres humanos cujas histórias são
específicas e diferenciadas e com subjetividades inerentes a cada caso.
Indivíduos que tratamos genericamente pelos conceitos de ‘alunos’ e ‘estudantes’,
o que também expressa uma forma de abstrair o fato de que são peculiares.
Dar aulas é
uma relação humana, com todas as características e dificuldades que encerram o
convívio entre docentes e discentes. Pressupõe respeito mútuo. Este é um
critério mínimo para a convivência civilizada. É preciso respeitar para ser
respeitado. E não devemos confundir temor com respeito à ‘autoridade
professoral’. O respeito deve se fundar na relação humana em si, no
reconhecimento deste simples fato.
A docência
também é uma relação de poder. Quanto mais tivermos consciência dessa
realidade, maior a probabilidade de atentarmos para as exigências éticas da
responsabilidade docente. O professor que abusa dos instrumentos de poder que
tem em mãos, das sanções formais ou informais, comete injustiças. Ele pode prejudicar
o desenvolvimento intelectual e até mesmo provocar traumas psicológicos. Por
isso, é necessário buscar a justa medida, ter a humildade de reconhecer erros e
abandonar a arrogância.
A atividade
docente exige um envolvimento que extrapola a sala de aula. Ao nos
comprometermos com corpo e alma na práxis docente, o risco é que ambos padeçam.
O corpo sofre pelo esforço físico e alma se emociona e pode adoecer. Mas há
também as alegrias que compensam e curam. A minha experiência, até o momento,
confirma.
É com este
espírito que recomeço o ano letivo. Sinto-me feliz por voltar às aulas, amo o
que faço. São novas turmas, outros alunos com suas particularidades,
expectativas, esperanças e sonhos. Várias subjetividades e histórias de vida.
Conhecer novas pessoas, estabelecer novas relações, renovar o desafio de
ensinar-aprender. Parece uma retomada da rotina docente: ler, preparar aulas,
dar aulas, atender alunos, orientações, etc. Mas é diferente, pois são outros
seres humanos.
A volta às
aulas renova as minhas esperanças quanto às potencialidades humanas de
superar-se e crescer intelectualmente e enquanto indivíduos críticos capazes
rejeitar a naturalização dos fatos e do viver em comunidade. Espero contribuir
para a formação humana e crescimento intelectual deles. Isso, é claro, aumenta
a minha responsabilidade.
Quem deseja
ensinar, deve reconhecer que não sabe tudo e estar disposto a aprender. Novo
ano e novas turmas significam também novas possibilidades de aprender. Aposto
nessa direção!
Adaptação
textual: Prof. Luciano Silva.
Texto
original: Ozaí Silva.